sexta-feira, 23 de julho de 2010

Se os seus olhos forem bons...: O TEMPO DO MAL DE ALZHEIMER E O TEMPO DE TODOS NÓS...

Se os seus olhos forem bons...: O TEMPO DO MAL DE ALZHEIMER E O TEMPO DE TODOS NÓS...: "Os lindos olhos azuis dela já não brilham mais como as contas de vidro de um colar. Também parecem ter perdido a destreza de mil direções e ..."

O TEMPO DO MAL DE ALZHEIMER E O TEMPO DE TODOS NÓS

Os lindos olhos azuis dela já não brilham mais como as contas de vidro de um colar. Também parecem ter perdido a destreza de mil direções e os registros simultâneos e espertos que faziam. Estão mais lentos, presos a um foco de cada vez, porém ganharam em profundidade, registram agora a memória de um tempo que se foi e a sabedoria da seleção do que ainda vale ser captado. Como seus olhos, toda a expressão de seu corpo está descompassada e parece deslocada dela mesma. Ainda assim minha mãe continua bela em seu processo de envelhecimento. As perdas se sucedem porque ela escolhe agora o que vale a pena ser mantido. Como um guarda roupa que é esvaziado pois seu conteúdo não tem mais uso, minha mãe limpa sua mente de tudo aquilo que considera agora de pouca importância. Ela já não se lembra dos nomes das ruas dessa nossa gigantesca cidade e que tinha na ponta da língua,recitando com segurança a quem perguntasse. Perdeu a referência das histórias que nos contava, e quase sempre está silenciosa e distante, sabe-se lá aonde... Mas curioso, não há tristeza nesse desligamento. Para mim, ela continua buscando. Só que agora, o invisível, o que é essencial para uma construção nova de si mesma e do caminho que começa a trilhar. Meu pai também faz sua trajetória, mas é verborrágica. Feita de muitas perguntas, repetitivas, óbvias, mas ainda assim envolvidas em ternura. Isso ele não perdeu, continua o doce e gentil pai que sempre tivemos orgulho de apresentar aos amigos, namorados e conhecidos. Papai é o amor no olhar, a bondade na disponibilidade de sempre para tudo e para todos, seja quem for. Ele também está partindo em busca de outra história, em outro plano. Meus pais, casados há 51 anos estão com Alzheimer e nós, as filhas aprendendo um novo tempo, o tempo deles que não é o nosso, mas que de alguma maneira, se conectam.
Não fomos preparadas para caminhar nesse tempo deles, tudo parece estranho e de certo modo angustiante, mas por incrível que pareça com um certo otimismo pode-se ganhar com isso. Estamos devolvendo a candura e preocupação com que nossa mãe nos tratou, as quatro filhas. As conversas com minha mãe agora são marcadas por um falar docemente infantil, como se ela fosse a nossa garotinha.E ela se delicia com esse pequeno mimo, sente-se protegida. Meu pai, precisa das respostas constantes, dadas seguidamente como se o assunto proposto não tivesse sido ventilado. Exercitamos a paciência, - tão limitada numa época imediatista como a nossa - devolvendo as perguntas e as respostas que ele já conhece.Esse caminhar está nos mostrando, que essa doença é a doença da afetividade, porque não é para os pais, mas para os filhos.Eles tornam-se dependentes como nós fomos um dia, e buscam o calor que nos deram um dia. Chegou a nossa vez de retribuirmos a construção dessa relação. Fica na minha memória um momento da "juventude" deles em plena maturidade, quando há quatro anos eles foram com meu filho Nando, na época com 24 anos, numa balada em Natal. Nando sentiu-se premiado, era o único entre tantos jovens compartilhando uma banda de rock com os avós!

Serviço: informações a respeito do Mal de Alzheimer buscar emwww.alzheimermed.com.br